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Clique em "+" (aproximar) e "-" (afastar), e veja os velhos currais do Rio Grande do sul feitos de terra, pedra e plantas. Imagens de satélite: Google Earth / Pesquisa e edição: Bruno Farias

Clique aqui e leia a reportagem "GEOGLIFOS GAÚCHOS" no site da Revista de História da Biblioteca Nacional sobre as misteriosas estruturas anelares encontradas no Rio Grande do Sul
Veja também o artigo "OS GEOGLIFOS DO RIO GRANDE DO SUL" que deu origem à reportagem no site da Revista de História da Biblioteca Nacional

MEMÓRIAS LEONENSES: personagens, lugares históricos e lendas de Capão do Leão/RS

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Clique nos links abaixo para acessar os CAPÍTULOS
- Introdução: um apanhado geral sobre alguns dos diversos períodos históricos pelos quais passou o atual território leonense
- Cap. 1 - Os geoglifos de Capão do Leão: saiba mais sobre as gigantescas estruturas de terra com até 120 metros de diâmetro que estão intrigando pesquisadores e que muitos moradores contam terem sido antigas mangueiras para contenção de gado, feitas por escravos numa época na qual ainda não existiam arames de metal no Rio Grande do Sul
- Cap. 2 - A casa onde viveu Hipólito José da Costa: conheça a propriedade onde o patrono da imprensa brasileira passou parte de sua infância e adolescência antes de se tornar um dos principais responsáveis pela fomentação do movimento em prol da independência do Brasil
- Cap. 3 - A cerca de pedra: que, segundo relatos, teria sido feita pelos escravos; e a casa de pedra que pode ter pertencido a Rafael Pinto Bandeira
- Cap. 4 - O Túmulo do Enforcado: que muitos acreditam realizar milagres e que é reverenciado pelos moradores há pelo menos 100 anos, mesmo que ninguém saiba direito quem ele foi

... e os EXTRAS...
- Mapas: Confira em alta definição os registros cartográficos usados como fonte pro MEMÓRIAS LEONENSES
- Depoimentos: ouça o que os moradores contam sobre alguns lugares históricos e lendas de Capão do Leão
- Faça seu relato: Saiba aqui como você pode enviar seu depoimento gravado via microfone ou webcam para o MEMÓRIAS LEONENSES
- Referências: Conheça as fontes usadas para a produção do MEMÓRIAS LEONENSES e acesse suas versões eletrônicas com um click
- Fotos: Nesta página você acessa os álbuns de fotos do MEMÓRIAS LEONENSES, individuais para cada capítulo. A medida que cada capítulo for sendo lançado, seu álbum de fotos correspondente será publicado também
Fotos do capítulo 1 - Os Geoglifos de Capão do Leão
Fotos do capítulo 2 - A casa onde viveu Hipólito José da Costa
Fotos do capítulo 3 - A cerca de pedra da época dos escravos
Fotos do capítulo 4 - O Túmulo do Enforcado

Em breve estaremos publicando os próximos capítulos:
- A ferrovia das pedreiras usada para transportar os blocos de granito utilizados na construção dos Molhes da Barra, em Rio Grande/RS
- Obeliscos da I e da II Guerra Mundial, os de pedra monumentos que marcaram em Capão do Leão o final desses conflitos
- A Mesa de Pedra, um marco de concreto construído em 1949 pelo exército que hoje está abandonado no topo da Serra do Pavão
- A Gruta do Miguel, caverna que serviu de esconderijo para um bando de ladrões de gado na década de 1950
- O Horto Florestal, local próximo ao centro de Capão do Leão que na década de 1950 recebia a visita de turistas mas que hoje está abandonado
- Pedra da Bandeira, formação rochosa implodida na década de 1970 que é um dos símbolos do município e que até hoje deixa saudades
- Homenagem aos graniteiros, estátua que é um tributo a essa profissão tão importante para o desenvolvimento da cidade
- Busto de Elberto Madruga, a homenagem a este que foi o primeiro prefeito de Capão do Leão
- Estátua do Leão, outro símbolo do município que remete a uma época na qual existiram pumas e até onças na região

Aguarde... Estamos buscando novas documentações para adicionar aos próximos capítulos do
"MEMÓRIAS LEONENSES: personagens, lugares históricos e lendas de Capão do Leão/RS"! Obrigado pela compreensão!

domingo, 22 de agosto de 2010

O lendário tesouro dos jesuítas, supostamente escondido em Capão do Leão/RS

Alguns moradores de Capão do Leão alegam que o ouro extraído pelos jesuítas em Caçapava do Sul era trazido para ser embarcado em navios no Canal São Gonçalo. Saiba mais sobre esse tesouro que supostamente estaria enterrado naquela localidade.

sábado, 17 de abril de 2010

Capítulo 4 - O TÚMULO DO ENFORCADO




LEIA ESTE TEXTO COM SUAS DEVIDAS REFERÊNCIAS, EM LETRAS MAIORES E COM IMAGENS CLICANDO AQUI

O Túmulo do Enforcado

Santa Tecla foi adotada por Capão do Leão como sua padroeira em 1990. Mas muito antes disso, em 1901, foi feita uma igreja dedicada a ela na avenida Narciso Silva com doações de, entre outras pessoas, do imigrante alemão Leopoldo Haertel. No ano de 1889 ele fundou em Pelotas a Cervejaria Sul Rio Grandense com um empréstimo dos donos da Cervejaria Ritter, um deles o ilustre morador da atual Faculdade de Medicina da UFPel, Carlos Ritter. A indústria de Haertel, hoje um prédio abandonado que ocupa uma quadra inteira em Pelotas, ultrapassou em 1922 a marca das 16 mil garrafas produzidas por dia, até que em 1946 foi vendida para a Companhia Brahma.

Porém a Igreja Santa Tecla não é a única construção relacionada à religiosidade existente no município. Há diversos altares com santos, capelas e paróquias em diferentes partes da cidade, como as santinhas do antigo Horto Florestal, a grutinha na Fazenda Santa Rita[8] e a Capela Nossa Senhora de Lourdes. Existe também, entre tantos outros exemplos[9], a cacimba do Padre Doutor, que se acreditava ter águas com propriedades curativas[10]. E também há um túmulo[11] num local próximo ao centro[12] cujo ocupante, segundo alguns, seria capaz de realizar milagres[13].

Conta-se que na década de 1950 vinham excursões até de Rio Grande com pessoas que faziam promessas e ofertavam flores e velas a este desconhecido enterrado no topo do morro da pedreira da EMPEM. Até hoje alguns moradores dizem que ele realmente atendia aos pedidos e as promessas de quem o visitava[14]. Mas, apesar dessa fama de milagreiro ter ultrapassado as fronteiras do município, ninguém sabe ao certo quem foi esse misterioso homem que faz parte da cultura leonense há pelo menos 100 anos[15]. Sua sepultura fica num local, de certa forma, perigoso, habitat de cobras cascavéis [16] e localizado a menos de 2 metros de um dos despenhadeiros escavados na rocha pelas empresas de mineração[17].

A grande maioria dos entrevistados a se recordarem de alguma coisa sobre essa história já tem mais de 50 anos de idade e dizem ter ouvido ela dos pais e avós, pois ainda não eram nascidos na época do ocorrido. Cipriano Sainz, de 88 anos, conta sobre as caçadas de tatu que fazia em sua infância, junto com seu pai, nos arredores do misterioso jazigo[18]. Branda Mendes, de 100 anos de idade, é uma das pessoas mais idosas do município, morou a vida toda em uma rua próxima à famosa tumba porém pouco sabe sobre a história do enforcado. “Quando eu era criança aquilo lá já era antigo” afirma[19].

Realmente, a história é bem antiga. O pesquisador leonense Arthur Victória Silva recuperou uma foto de 1926 da “Figueira dos Enforcados”, uma árvore que se destaca no morro da pedreira da EMPEM e que talvez seja a mesma que alguns apontam até hoje como sendo o local onde o pobre homem teria morrido[20]. Outros acreditam que o enforcamento teria acontecido com um arame preso numa pedra[21], e há até quem diga que a árvore era uma capororoca “que dava só 3 folhas” e que quem a derrubou acabou morrendo em seguida[22]. Houve até quem falasse sobre o lugar ser mal-assombrado, mas pouco se sabe de concreto sobre o fato e até então é impossível dizer com certeza se o pobre homem morreu pendurado numa figueira[23], numa capororoca[24] ou numa pedra[25].

Apesar de todo esse mistério quanto à idade e à identidade do morto e quanto aos motivos de sua morte, a história do jazigo em si não é tão misteriosa: alguns moradores ainda lembram das benfeitorias feitas no local em diferentes épocas. Um pedaço do crucifixo de pedra que teria sido colocado ali originalmente[26] jaz até hoje sobre a tumba[27]. Adelar Rodrigues conta que inicialmente lá havia apenas essa cruz, e que o atual túmulo foi construído por Varonildo Motta, na época em que a pedreira ainda era administrada pela SAPEM[28]. Branda Mendes recorda que o crucifixo de metal, mais recente, teria sido fixado por seu filho José Armando Mendes, já falecido, no topo da grutinha feita pelos funcionários da pedreira[29].

Talvez uma futura busca nos registros das empresas que exploraram as jazidas de granito na época possa nos revelar mais informações sobre as alterações no local de descanso final do enforcado, porém mesmo assim é possível que a identidade do morto continue sendo uma incógnita. Quase ninguém até agora soube dizer com certeza quem ele era. Enquanto uns crêem que ele possa ter tirado a própria vida, outros falam que ele pode ter sido morto executado, quando não consideram as duas possibilidades.

Há quem relacione as construções no morro das pedreiras à Revolução Farroupilha: o Obelisco da I Guerra Mundial, que fica a alguns metros dali, foi confundido como tendo sido feito na época dos farrapos[33]. Realmente ocorreram combates no atual Capão do Leão durante este conflito[34], um deles próximo à atual zona urbana, como calcula o historiador Joaquim Dias[35]. Mas depois foi constatado que na verdade o monumento foi erigido em 1919[36].

Dias também conta ter ouvido um idoso que falou sobre o jazigo existir desde a época na qual “tudo aquilo ainda era campo”[37]. Já o ex-graniteiro José Armando de Andrade, de 59 anos, relata que o enforcado teria se suicidado depois de ter sido deixado pela família, isso graças aos seus problemas com a bebida[38]. Outra versão contada pelos leonenses Adelar Rodrigues e sua esposa Teresinha, vizinhos da Pedreira da EMPEM, diz que aquele seria um índio que apareceu enforcado muitos anos antes de se iniciarem os trabalhos de extração de granito no local, inaugurados pela Compagnie Française du Port de Rio Grande do Sul em 1908[39].

Seria ele realmente um indígena? Não é possível afirmar. Porém, coincidência ou não, um texto sem autoria nem data arquivado na Biblioteca Hipólito José da Costa uma referência à lenda de Nhandú-Tatá, um índio Tape que trabalhava como peão num potreiro próximo ao rio Piratini, na época das primeiras sesmarias. Acusado de roubar alguns cavalos do patrão, Nhandú teria fugido para Capão do Leão.

O mito conta que ele foi perseguido por um grupo de portugueses e que acabou sendo capturado e executado à beira do arroio São Thomé, atual Theodósio, próximo a uma enorme rocha[40]. Seria ela a extinta Pedra da Bandeira, que ficava próxima ao referido curso d´água e também ao misterioso jazigo do enforcado[41]? O que podemos dizer com certeza é que segundo um mapa de 1784 digitalizado por Arthur Victória Silva a nomeação “São Thomé” já havia sido substituída pelo topônimo “Arroio del Padre” na década de 1780[42]. Ou seja: a história do índio Nhandú é realmente muito antiga.

Esse misterioso trabalho de autoria desconhecida pode ou não ter a ver com o enforcado, e não foram encontrados textos dedicados à história do misterioso ocupante daquele túmulo. Somente pouquíssimos relatos conservados oralmente pelos moradores da localidade, quase sempre ouvidos de seus antepassados. Ou seja: a falta de provas documentais impede que descubramos até o momento quem realmente foi esse ilustre desconhecido.

O assunto poderia ser facilmente desvendado após uma rápida investigação arqueológica. Uma datação por Carbono 14 poderia dizer a época aproximada na qual o enforcado viveu, e profissionais especializados seriam capazes de dizer até a sua etnia a partir de uma análise dos restos mortais... Agora só nos resta esperar que o caso desperte o interesse das autoridades e receba estudos mais aprofundados até para que, quem sabe, futuramente, ele possa voltar a receber turistas. Vale a pena investir nisso, afinal de contas, o Túmulo do Enforcado faz há pelo menos um século da história e da religiosidade de Capão do Leão.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Capítulo 3: A CERCA DE PEDRA DA ÉPOCA DOS ESCRAVOS

Conheça a mangueira de pedra do século XIX que, segundo relatos, teria sido feita pelos escravos; e a casa que pode ter pertencido a Rafael Pinto Bandeira

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No século XIX as fazendas e estâncias da região começaram a contar com construções bem mais duráveis do que as casas de pau-a-pique feitas originalmente em certas propriedades[1]. Muitas terras receberam muros de pedra como o que existe nos limites oeste das terras que pertenceram ao Alferes Feliz da Costa Furtado de Mendonça, pai de Hipólito José da Costa[2]. Possivelmente a mesma mangueira citada mais tarde nos inventários de João Nunes Baptista[3] e seu genro Francisco Gonçalves Victorino[4].
Os muros de pedra localizados na parte sudoeste da Serra do Pavão têm aproximadamente 1 km de extensão, começando com um pequeno trecho de aproximadamente 70 metros que segue na direção sudoeste-oeste até a esquina com a parte maior da cerca, que dobra à direita num ângulo de 90 graus em direção ao norte-noroeste, fechando o rincão formado pelas nascentes do arroio Quilimaco
[5]. Construída com blocos de pedra encaixados[6], a mangueira pode ser vista por imagens de satélite a mais de 10 mil metros de altura graças à vegetação que a salientou, cobrindo-a quase que totalmente[7]
.
Essa cerca dita “do tempo dos escravos”
[8] é igual a tantas outras existentes no Rio Grande do Sul[9]. Porém, por ser relativamente próxima à zona urbana de Capão do Leão ela futuramente poderá se tornar até um ponto turístico, recebendo visitas não só de turistas como também de moradores locais. É o caso de alguns alunos do ensino fundamental, que em 2008 estudavam na escola Bordalo de Pinho. Na época eles fizeram uma visita à mangueira de pedra e tiraram fotos, depois publicadas em primeira mão no blog “Capão do Leão: Cultura & História”[10]
.
A tradição oral leonense realmente conta que ela seria mesmo do período anterior à abolição da escravatura
[11], mas dependendo de quem está contando a história, a afirmação pode ganhar ainda mais peso. Em 1990, Agostinho Dalla Vechia publicou o livro “Vozes do Silêncio: depoimentos de descendentes de escravos do Meridião Gaúcho”. Um deles, chamado Segundino Rosa, na época tinha 78 anos e recordava que no Cerro das Almas existem construções feitas pelos cativos, como cercas, taperas e casas, tudo feito de pedra[12]
. Porém ainda assim continua havendo dúvida quanto aos verdadeiros autores do muro em questão e à sua idade exata, já que até 2009 ela ainda não havia sido estudada por ninguém. Além do que as fontes documentais relacionadas à construção são escassas e as que se conhece muitas vezes são inexatas ou pouco detalhadas.
Somente após 1780 é que foi aumentar a população de escravos negros no estado
[13]. E só no início do século XIX alguns estancieiros mais ricos, que dispunham de mão-de-obra escrava em maior número, passaram a mandar construir mangueiras com pedras empilhadas perto de suas casas. Depois, no final do mesmo século, muitos dos escravos existentes no estado foram sendo vendidos a altos preços para os cafeicultores paulistas - isso aconteceu ao longo da década de 1870, junto com a chegada dos arames de metal ao Rio Grande do Sul. Em 1875 o Uruguai aboliu as taxas alfandegárias para a exportação dos arames, o que facilitou a entrada dos alambrados modernos no território gaúcho[14]
.
Levando em conta esses dados e a cultura oral de Capão do Leão poderíamos então chegar à conclusão de que o muro de pedra pode ter sido construído entre 1780 e 1870 – ou seja, num espaço de tempo de 90 anos. Porém existem outras informações que também devem ser levadas em conta: de acordo com um mapa de 1807 encomendado por Luíz Corrêa Teixeira de Bragança, que atribuía erroneamente as nascentes do Quilimaco ao arroio São Thomé, os limites oeste das terras de Feliz da Costa ficavam naquele local
[15]. O Alferes Real faleceu em 1819 e o testamento dele[16], assim como o mapa de 1807, não menciona nenhuma mangueira de pedra. Referencia somente a morada de Feliz da Costa[17], no terreno do Padre Doutor (atual estância Santa Tecla)[18], e a “Casa do Arvoredo” [19], hoje propriedade de Edar Ribeiro[20]. Esta última, segundo o mapa, naquela época seria a construção mais próxima do local onde está a mangueira, a aproximadamente 3 km dali[21]
.
Nos inventários de João Nunes Baptista e de Francisco Gonçalves Victorino
[22], que podem ter sido donos da “Casa do Arvoredo”, constavam uma cerca e uma moradia feitas de pedra que pode ser a mesma indicada pelo mapa. Mas apesar dela já constar no mapa de 1807[23], os documentos referidos acima só foram mencionar a residência em 1868[24] e em 1879[25] respectivamente. Em 1838 a filha de Baptista com se casou com Victorino[26], em cujo processo de inventário também foram citadas a cerca e a casa, agora mencionada como de pedra e tijolos e coberta com telhas[27], diferente da original que era de pedra e coberta com capim[28]. Essas descrições realmente batem com a casa antiga que hoje pertence a Edar Ribeiro[29], feita de pedra recoberta com tijolos[30] e que, segundo o mapa de 1807, seria a mesma “Casa do Arvoredo”[31]
.
Ribeiro conta que essa mesma casa, onde ele nasceu há mais de 80 anos atrás, teria pertencido a Rafael Pinto Bandeira
[32]. Apesar disso, o inventário do Brigadeiro menciona apenas “huma morada de casa vivendas e de tijolos coberta de telhas” e “huma casa de pau-a-pique”, sem dar detalhes sobre uma casa feita de pedra[33]. Porém quem encomendou a medição da Estância do Pavão em 1807 foi o Desembargador Luíz Corrêa Teixeira de Bragança[34], mesmo ano no qual ele se casou com dona Maria Josefa, viúva de Rafael Pinto Bandeira, falecido apenas 12 anos antes. Depois, em 1816, João Nunes Baptista comprou a propriedade [35], que depois foi deixada para sua filha Senhorinha Nunes Baptista e para seu esposo Francisco Gonçalves Victorino[36]. Descendente destes era Teófilo Torres[37], proprietário das terras onde está a “Casa do Arvoredo” em 1911[38]. E depois Edar Ribeiro teria herdado o terreno de sua tia, dona Bebé, que foi a segunda esposa de Torres, conforme conta o pesquisador leonense Arthur Victória Silva[39]
.
Ou seja: apesar de não serem conhecidas referências mais detalhadas quanto a isso, é possível que a casa realmente tenha pertencido ao Brigadeiro, ainda mais se pensarmos na importância estratégica daquele local. De lá se pode acessar em poucos minutos o topo da Serra do Pavão
[40], local do qual é possível ver o Canal São Gonçalo, a Lagoa dos Patos, Pelotas e até o Oceano Atlântico[41]. Além do que a casa é praticamente uma fortaleza, com espessas paredes de pedra e uma vista panorâmica que permite visualizar boa parte do município[42]
.
Entre outras construções existentes na propriedade, também há referências a uma senzala
[43]. Ester Gutierrez relata que quando Baptista morreu, em 1823[44], deixou 66 escravos, e que sua esposa Joaquina teria deixado 30[45], além do que o próprio Rafael Pinto Bandeira também era conhecido por comerciar escravos na região[46]
. Esses fatores, unido à história contada por Segundino Rosa e por tantos outros moradores de Capão do Leão, faz crer que o muro de pedra possa mesmo ter sido feito pelos escravos, possivelmente antes de 1823 e com certeza antes de 1868.
Mas, além das dúvidas quanto à autoria do muro de pedra da Serra do Pavão, existem outros exemplos do período escravista não muito longe de Capão do Leão. Na propriedade de Nelson Mello, na Estrada do Passo dos Carros pouco antes da divisa entre Pelotas e Capão do Leão, há até hoje uma antiga senzala com grades nas janelas. E na Charqueada São João, em Pelotas/RS, ainda existem a senzala, o tronco, os grilhões e a marca em forma de letra F gravada a ferro quente nos escravos fujões
[47]
.
Infelizmente nem todos os vestígios dessa época foram preservados: Fernando Luís Osório relembrou em seu livro “A Cidade de Pelotas”, de 1922, sobre um pelourinho que existiu na atual Praça Coronel Pedro Osório e que depois foi retirado dali. No local hoje está a Fonte das Nereidas
[48], um dos mais importantes monumentos do município, que marcou a chegada da água encanada a Pelotas em 1874[49]. Agora é necessário preservar estes lugares para que, assim como o antigo pelourinho da praça, eles não acabem desaparecendo pra sempre.
REFERÊNCIAS DESTE CAPÍTULO:
[1]
GUTIERREZ, 1993. MACHADO, 2008.
[2]
BRAGANÇA, 1807.
[3]
BAPTISTA, 1868.
[4]
VICTORINO, 1879.
[5]
GOOGLE EARTH, 2009.
[6]
FARIAS, 2009b.
[7]
GOOGLE EARTH, 2009.
[8]
DIAS, Joaquim. Entrevista concedida a Bruno Martins Farias. Capão do Leão, 2009.
[9]
GOOGLE EARTH, 2009.
[10]
DIAS, J., 2009c.
[11]
ANDRADE, 2009. DIAS, J., 2009c. FURTADO, 2009. MACEDO JUNIOR, 2009. MORALES, 2009. OLIVEIRA, V., 2009. RIBEIRO, E., 2009. ROSA, A., 2009. SILVA, D., 2009.
[12]
DALLA VECCHIA, 1994.
[13]
GUTIERREZ, 1993.
[14]
MACHADO, 2008.
[15]
BRAGANÇA, 1807.
[16]
SILVA, Arthur Victória. Estância Sant´anna: Resumo histórico séculos XVIII e XIX. Capão do Leão, 27/07/2008. Disponível em: ttp://capaodoleao.blogspot.com/2008/07/290-estncia-santanna-resumo-histrico.html. Acesso em 15, mar., 2010.
[17]
BRAGANÇA, 1807.
[18]
SILVA, Arthur Victória. Estância Sant´anna: Resumo histórico séculos XVIII e XIX. Capão do Leão, 27/07/2008. Disponível em: . Acesso em 15, mar., 2010.
[19]
BRAGANÇA, 1807.
[20]
RIBEIRO, E., 2009.
[21]
BRAGANÇA, 1807.
[22]
BAPTISTA, 1868. VICTORINO, 1879
[23]
BRAGANÇA, 1807.
[24]
BAPTISTA, 1868.
[25]
VICTORINO, 1879.
[26]
LOPES, 2008.
[27]
VICTORINO, 1879.
[28]
BAPTISTA, 1868.
[29]
RIBEIRO, E., 2009.
[30]
FARIAS, 2009b.
[31]
BRAGANÇA, 1807.
[32]
RIBEIRO, E., 2009.
[33]
SILVA, A. Estância do Pavão: resumo histórico 1775 a 1861. Blog História de Capão do Leão. Capão do Leão: História de Capão do Leão, 27/07/2008. Disponível em: . Acesso em 15, mar., 2010.
[34]
BRAGANÇA, 1807.
[35]
SILVA, A. Estância do Pavão: resumo histórico 1775 a 1861. Blog História de Capão do Leão. Capão do Leão: História de Capão do Leão, 27/07/2008. Disponível em: . Acesso em 15, mar., 2010.
[36]
VICTORINO, 1879.
[37]
LOPES, 2008.
[38]
MAPPA do Município de Pelotas, 1911.
[39]
SILVA, Arthur Victória. Entrevista concedida a Bruno Martins Farias. Capão do Leão, 2009.
[40]
GOOGLE EARTH, 2009.
[41]
FARIAS, 2009b.
[42]
FARIAS, 2009b.
[43]
VICTORINO, 1879.
[44]
SILVA, A. Estância do Pavão: resumo histórico 1775 a 1861. Blog História de Capão do Leão. Capão do Leão: História de Capão do Leão, 27/07/2008. Disponível em: . Acesso em 15, mar., 2010.
[45]
GUTIERREZ, 1993.
[46]
FRAGOSO, J., et al., 2007.
[47]
FARIAS, 2009b.
[48]
OSÓRIO, F., 1962.
[49] XAVIER, 2004.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

DEPOIMENTOS



CLIQUE NOS LINKS ABAIXO E OUÇA OS RELATOS DOS MORADORES DE CAPÃO DO LEÃO E REGIÃO SOBRE ALGUMAS DAS LENDAS E LUGARES HISTÓRICOS DA CIDADE:




Entrev Florencio Rodrigues Marques, 65, morador de Rio Grande/RS

Entrev Ariovaldo Dutra Barros, 63, av 25 de julho

Eugênio Silva de Alencar, 75, o Mestre Paraquedas da Ação Griô

Entrevista com Edar Ribeiro e João Amauri de Oliveira-

Entrevista com Mozar Costa Ribeiro

entrev Leomar Ceus

entrev carlos alberto moreira blaas (secret agricultura CDL)

Entrev Guido Clasen (60)

entrev joao amauri de oliveira (53)-

Entrev Osmar Ramalho (80)

entrev ubaldino silveira 67

entrev joel soares da silva (51)-

Luis Carlos Dias (Passo dos Carros)

Entrevista com Gilmar Maciel

Entrev c paulo roberto da silva 62 e dalva ribeiro da silva 65

entrevista com Adão Soares Cardoso

Entrevista com José Armando de Andrade (bolela) - graniteiro

Entrevista com Gilberto Macedo Júnior

Entrevista com Manoel Goulart e Gilberto Macedo Júnior

Entrevista com Valdor Morales

Entrevista com Vagner de Oliveira

Entrevista com Charles Furtado - 17 anos

entrevista com Neida Eifler

Entrevista com Solmar Val

entrev com Joel da Silva (51) e José Belarmino da Silva (47)

Fonte: MEMÓRIAS LEONENSES Vídeos do MySpace



MAPAS


Clique no texto abaixo e veja em alta definição os mapas publicados no site MEMÓRIAS LEONENSES:








quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A casa de Hipólito José da Costa


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Depois da fundação das primeiras estâncias Capão do Leão deixou de ser um mero local de passagem, quando algumas famílias vindas de territórios invadidos pela Coroa Espanhola vieram se refugiar no atual território leonense. Nessas terras que foram parte de Rio Grande e também de Pelotas[1] cresceu o patrono da imprensa brasileira, Hipólito José da Costa[2]. Filho do alferes real Félix da Costa e nascido na Colônia de Sacramento[3] em 1774[4], ele veio com a família para a região devido à invasão da cidadela portuguesa pelos espanhóis em 1777. Hipólito e sua família e vieram para Capão do Leão entre 1778 e 1779[5], apesar de só terem recebido a posse oficial das terras em 1794[6]. Nesse período, em 1784, seu tio Pedro Pereira de Mesquita, o Padre Doutor, recomendou a criação de uma nova freguesia no local devido ao fato de que lá já viviam cerca de 150 famílias - solicitação que só se concretizou em 1810 após insistentes pedidos dos moradores da então São Francisco de Paula, atual Pelotas[7].
Em 1792, aos 17 anos de idade, Hipólito se matriculou nas faculdades de Direito e de Filosofia da Universidade de Coimbra, em Portugal
[8], onde se formou em 1797[9]. No ano seguinte[10] foi enviado para a América onde viu pessoalmente a democracia já em funcionamento e onde se filiou à maçonaria[11]. O jovem Hipólito logo se distanciou de sua família religiosa[12] e passou a se dedicar aos movimentos maçônicos que na época lutavam pela independência de países como o Brasil e os Estados Unidos, entre outros[13]
.
Em 1800 foi nomeado Diretor da Imprensa Régia
[14] e dois anos depois viajou para Londres em missão oficial com o objetivo de adquirir livros para a Real Biblioteca e máquinas para a Imprensa Régia. Porém hoje sabe-se que seus motivos também eram o de obter proteção com a maçonaria inglesa para as atividades das Lojas Maçônicas Portuguesas, que na época eram proibidas no território de Portugal[15]. Hipólito acabou sendo preso pelo Santo Ofício entre 1801 e 1803 acusado de ser maçom[16] e livre-pensador[17] - o que depois ele mesmo declarou não ser crime segundo as leis portuguesas, mas uma proibição da própria igreja[18]. Mas Hipólito conseguiu fugir sob a proteção de seus irmãos maçons[19]
em 1805, quando foi exilado em Londres sob a proteção do Grão-Mestre da maçonaria inglesa, o príncipe Augusto Frederico do Reino Unido, também conhecido como Duque de Sussex.
De acordo com Isabel Lustosa em sua reportagem “A imprensa brasileira longe da pátria”, publicada pela revista História Viva em janeiro de 2008, somente com a chegada de D. João VI em maio de 1808 é que foram permitidas as letras impressas no Brasil e uma gráfica trazida pelo próprio monarca passou a publicar em setembro do mesmo ano o semi-oficial “Gazeta do Rio de Janeiro”. Também segundo Isabel, o primeiro jornal a circular no país foi na verdade o “Correio Braziliense”, produzido por Hipólito José da Costa na Inglaterra e lançado em 1º de junho de 1808, quando o jornalismo independente ainda era proibido por aqui. Através da publicação ele defendeu, entre outras idéias, a Independência do Brasil.
A publicação só parou de ser impressa com o grito do Ipiranga
[20], ocorrido em 1822[21]. Depois disso Hipólito foi nomeado Cônsul do Brasil na Inglaterra, onde faleceu no dia 11 de setembro de 1823[22]. O patrono da imprensa brasileira[23] deixou a esposa Mary Aun Troughton, com quem se casou em 1817, e três filhos. Depois de sua morte foi homenageado ao emprestar seu nome a uma das cadeiras da Academia Brasileira de Letras[24]. Mas apesar da biblioteca pública de Capão do Leão ter recebido também essa mesma denominação[25]
, a história de Hipólito José da Costa e seu papel no processo de independência do nosso país são desconhecidos para muitos moradores do município.
A estância Santa Tecla, logo no início da avenida Narciso Silva, foi o local onde viveu esse homem tão importante para a instauração da democracia em nosso país
[26]. De acordo com a escritora pelotense Zênia de Leon e com a proprietária das terras onde Hipólito José da Costa passou sua infância e adolescência, Berenice Vilela, a grutinha que cobre a antiga cacimba do Padre Doutor e a pia usada por ele para batizar os primeiros habitantes da localidade continuam lá e permanecem preservadas[27], porém o local é uma propriedade particular e não está aberto para a visitação[28]
.
REFERÊNCIAS
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GUTIERREZ, 1993.
[2]
DALL´AGNOL, 1993. GUTIERREZ, 1993. OSÓRIO, F., 1962. SILVA, A., 2006b. SILVA, A., 2006g.
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[25]
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[26]
BRAGANÇA, 1807.
[27]
VILLELLA, 2008. DE LEÓN, 2009.
[28] DE LEÓN, 2009.

OS GEOGLIFOS DE CAPÃO DO LEÃO


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Visíveis até do espaço, centenas de anéis de terra no sul do país abrem um mistério sobre suas verdadeiras origens e funções. Com até 120 metros de diâmetro e presentes em diversas cidades do Rio Grande do Sul, estas estruturas seriam cercas feitas por escravos com torrões de terra no início da colonização, segundo alguns moradores locais. Nas mesmas rotas onde elas estão localizadas, entre Pelotas e Dom Pedrito, também existem mangueiras de pedra circulares com as mesmas proporções, velhas conhecidas da cultura gaúcha. Mas mesmo assim há quem cogite a possibilidade destas construções, apelidadas de geoglifos por serem melhor visualizadas do alto, terem raízes mais profundas, remontando à pré-história.
As taipas de pilão, feitas com torrões de argila prensados, eram comuns no Brasil colonial. Também se sabe que os currais de pau-a-pique com esse tamanho costumavam ser utilizados para marcação de gado, conforme conta o autor uruguaio Aníbal Barrios Pintos em seu livro “De las vaquerias al alambrado” (Ediciones Del Novo Mundo, 1967). E no Uruguai e em Santa Vitória do Palmar/RS, alguns desses círculos cercados de árvores que já haviam sido citados em 1820 por Auguste Saint-Hilaire foram documentados como “currais de palmas”. Segundo Pintos e os historiadores André Oliveira e Cláudia Teixeira, depois de cavadas as valas, eram transplantadas mudas de palmeiras, que tinham os espaços entre elas fechados com tiras de couro. Ao ver imagens das supostos cercados, Oliveira concordou com a versão contada pelos moradores: “Essas estruturas se parecem com os Currais de Palmas encontrados nesta região onde é peculiar a palmeira Butiá capitata. Realmente devem ser encerras, ou seja, currais. No caso de serem de terra deve-se analisar melhor as elevações, provavelmente realizadas por escravos”. O pesquisador estima a idade dessas construções em aproximadamente 200 anos, mesma opinião do professor Joaquim Dias, formado em História e expert na história da cidade de Capão do Leão, que diz que “a época pode se situar desde 1780 até 1900, ou seja, é muito tempo”.
Os arames de metal só chegaram ao estado na década de 1870. Antes disso, as cercas eram feitas com muros de pedra ou com outros materiais como valas cavadas no chão, madeira beneficiada, ananás, bananeiras, pessegueiros e outras árvores frutíferas, bromélias, espinheiros, cana, cactus e até de pau-a-pique. Diferentes fontes falam das rotas usadas para transporte de vacas, cavalos e mulas passando por essa região já a partir do século XVIII, e foi encontrada em um antigo inventário menção a uma Estrada Real passando pelo local ainda no século XIX. Além dos relatos de diversos moradores que chamam a Estrada do Passo dos Carros entre Capão do Leão e Pelotas, onde estão localizados alguns desses enormes círculos, de “Corredor das Tropas”.
Existem também inúmeras citações dos currais sendo usados pelos colonizadores da região durante o século XVIII, na época da preia do gado cimarrón, antes pertencente aos jesuítas. Segundo mapas antigos e outras referências, os tropeiros que transportavam esses animais realmente passavam por ali, além de fotos e textos situarem algumas dessas mangueiras de pau-a-pique e de pedra nos atuais municípios gaúchos de Pelotas, Capão do Leão, Aceguá, Bagé e em outras cidades próximas. Porém, mesmo sendo tão faladas, é raro encontrar referências visuais sobre os tais cercados, o que mantém o assunto misterioso.
Apesar de tudo isto bater com a teoria dos anéis de terra como antigas encerras, eles também podem ter sido construídos por povos nativos. Nesse caso a tradição popular que fala das estruturas anelares no Rio Grande do Sul poderia estar equivocada ou simplesmente incompleta, assim como aconteceu com os geoglifos do Acre. Lá, pensava-se que eles seriam “trincheiras da Revolução Acreana”, porém a hipótese ficou defasada quando arqueólogos descobriram que foram povos pré-históricos os autores daquelas construções.
Diferente do que correntes mais antigas da arqueologia defendiam quando se referiam aos indígenas pré-colombianos como “pequenos grupos nômades que quase não causavam impacto no ambiente onde viviam”, essas pessoas podem ter mobilizado suas sociedades para a construção de fortificações, caminhos elevados, currais de pesca, monumentos funerários e centros cerimoniais, entre outras funções atribuídas pelos especialistas a essas estruturas de terra. É o que conta Charles Mann em seu livro “1491: Novas revelações das Américas antes de Colombo” (Ed. Objetiva, 2005). Exemplos disso são os mounds da América do Norte, os geoglifos do Acre, os cerritos e sambaquis do litoral sul/sudeste do Brasil, as elevações artificiais existentes no estado boliviano de Beni, e as antigas estradas e aldeias cercadas de fossos nas proximidades do rio Xingu, em Mato Grosso, entre outros.
Rodrigo Aguiar, co-autor do livro “Geoglifos da Amazônia - Perspectiva Aérea” (Faculdades Energia, 2005), fala sobre o método de construção das formas geométricas do Acre: “cortes são escavados, e a terra extraída é, cuidadosamente, depositada ao lado do sulco, formando figuras em alto e baixo relevo”. Aguiar viu imagens dos anéis de terra do extremo-sul gaúcho e disse estar convencido de que alguns deles também podem ser pré-históricos. Assim como o arqueólogo Fábio Vergara Cerqueira: “Pensei muito nesta hipótese quando vi as fotografias. Na medida em que se descobrem geoglifos no Acre, existe igualmente a possibilidade de geoglifos em nossos campos”.
André Prous relatou em seu livro “O Brasil antes dos brasileiros” (Jorge Zahar Editor, 2006) que as formas geométricas escavadas no território acreano, “muito parecidas com as assinaladas no Rio Grande do Sul, associadas à Cultura Taquara/Itararé, são em geral interpretadas pelos arqueólogos como estruturas defensivas e apresentam um fosso largo”, referindo-se àquelas já estudadas no norte/nordeste do estado. Esses sítios arqueológicos classificados como “estruturas anelares” têm entre 20 e 170 metros de diâmetro e também existem no Paraná, em Santa Catarina e até na Argentina.
É possível acreditar que eles sejam similares aos de Capão do Leão e outras cidades próximas se os compararmos a uma ilustração reproduzida por Letícia Morgana Müller em sua dissertação de mestrado “Sobre ossos e índios” (PUC/RS, 2008). O desenho mostra um dos anéis de terra citados por Prous com uma borda idêntica às dos geoglifos do extremo-sul. Mas Ana Maria Rüthschlling apimenta ainda mais a discussão ao relembrar em “Pesquisas arqueológicas no baixo rio Camaquã” (UNISINOS, 1989) que a cultura Taquara seria intrusiva na região de Pelotas. Isso poderia enfraquecer a hipótese dos geoglifos em questão serem resquícios desse povo, já que seria necessário mobilizar um bom número de pessoas para se produzir tal tipo de benfeitoria.
Ou seja: ainda há muito o que se estudar antes que se possa chegar a uma conclusão definitiva sobre os geoglifos do sul/sudoeste do Rio Grande do Sul. Até lá, a dúvida continua em aberto. Quanto tempo irá demorar até que todas essas estruturas anelares sejam escavadas e tenham suas verdadeiras funções e idades reveladas? Talvez muitos anos. Mas elas continuarão lá, inertes e silenciosas, à espera de alguém interessado em trazer à tona sua verdadeira origem.